Comentário

Orçamento da UE: menos<br>coesão mais agressão

João Pimenta Lopes

Está em dis­cussão no Par­la­mento Eu­ropeu o pro­jecto de Or­ça­mento da União Eu­ro­peia para 2016, do­cu­mento de ex­tra­or­di­nária di­mensão e com­ple­xi­dade.(1) São mi­lhares de pá­ginas, de­zenas de do­cu­mentos, cuja versão final será apro­vada, pre­vi­si­vel­mente, no final de Ou­tubro.

Sob pro­posta da Co­missão, e com base no Quadro Fi­nan­ceiro Plu­ri­a­nual 2014-2020, a pro­posta de Or­ça­mento co­meça a cons­truir-se com a de­fi­nição da con­tri­buição de cada Es­tado-membro para este bolo geral. Esta con­tri­buição, em prin­cípio pro­por­ci­onal à ri­queza re­la­tiva de cada Es­tado-membro, acaba por ver essa pro­por­ci­o­na­li­dade dis­tor­cida por um con­junto di­verso de fac­tores. O total de pa­ga­mentos pre­vistos no or­ça­mento é de 143 541 453 114 euros. Cento e qua­renta e três mil qui­nhentos e qua­renta e um mi­lhões de euros. Um valor cerca de trinta mil mi­lhões de euros abaixo do PIB por­tu­guês de 2014 que se­gundo o INE se situa nos 173 mil e 44 mi­lhões de euros.

Este é, na ver­dade, um valor bas­tante li­mi­tado. Po­dendo ser ba­li­zado em até um mon­tante de 1,23 por cento do Ren­di­mento Na­ci­onal Bruto (RNB) do con­junto dos 28 países in­te­grantes da UE, o Or­ça­mento para 2016 pro­posto pela Co­missão de­finiu como con­tri­buição o valor de 0,97 por cento do RNB. Sendo o valor no­minal su­pe­rior ao or­ça­men­tado para 2015, cons­titui de facto um corte, já que para esse ano a con­tri­buição por país foi blin­dada em um por cento, con­fir­mando a ten­dência de re­dução do Or­ça­mento da UE que vimos de­nun­ci­ando nos úl­timos anos.

A lei­tura da in­tro­dução geral desta pro­posta faz res­saltar al­guns as­pectos que evi­den­ciam o cariz ca­pi­ta­lista deste pro­cesso de in­te­gração eu­ro­peia. Tra­tando-se do pri­meiro or­ça­mento da UE na era Juncker, é evi­dente o ali­nha­mento que se pre­tende dar ao plano que tem o seu nome. Aliás, não por acaso, a pri­meira pri­o­ri­dade iden­ti­fi­cada é a pro­moção do em­prego, do cres­ci­mento e do in­ves­ti­mento. E em que se ali­cerça este ob­jec­tivo? Na im­ple­men­tação das re­formas es­tru­tu­rais e me­didas es­tra­té­gicas em curso e no apro­fun­da­mento da União Eco­nó­mica e Mo­ne­tária. A par do «novo im­pulso para o em­prego» que re­ferem, estão para nós claros os passos com que se cons­trói este ca­minho. A maior alo­cação de verbas pú­blicas a in­ves­ti­mentos pri­vados que abram novas vias para a con­cre­ti­zação das cha­madas par­ce­rias pú­blico-pri­vadas, a par de me­didas no plano la­boral que re­duzam o valor da mão-de-obra, li­mitem os di­reitos dos tra­ba­lha­dores e fra­gi­lizem os vín­culos con­tra­tuais.

No quadro-re­sumo apre­sen­tado, com os va­lores para as do­ta­ções de pa­ga­mentos, são bem claras as pri­o­ri­dades desta União Eu­ro­peia. Nas ru­bricas de «cres­ci­mento», uma re­dução ao valor or­ça­men­tado. Um apa­rente au­mento com o jargão «em­prego» que serve, na prá­tica, os ob­jec­tivos que atrás re­tra­támos à custa do au­mento das ru­bricas: Fundo Eu­ropeu para In­ves­ti­mentos Es­tra­té­gicos – o dito Plano Juncker (510 mi­lhões); Quadro Es­tra­té­gico Comum In­ves­ti­gação e Ino­vação que é, no es­sen­cial o pro­grama Ho­ri­zonte 2020 (978,9 mi­lhões); En­sino, For­mação e Des­porto – ERASMUS+ (418,2 mi­lhões); Me­ca­nismo In­ter­ligar Eu­ropa – pro­jectos na área dos trans­portes, energia e co­mu­ni­ca­ções (225,2 mi­lhões).

Uma clara re­dução na «Co­esão», que sofre um ex­pres­sivo corte, re­du­zindo as verbas de uma ru­brica que po­de­riam con­tri­buir para o de­sen­vol­vi­mento das re­giões ul­tra­pe­ri­fé­ricas ou menos de­sen­vol­vidas.

Também os re­cursos na­tu­rais são afec­tados, ru­brica que in­tegra os apoios aos sec­tores pro­du­tivos, onde se in­te­gram a Agri­cul­tura e o de­sen­vol­vi­mento rural ou os As­suntos Ma­rí­timos e Pescas, esta úl­tima com um corte pre­visto nos pa­ga­mentos de 24,9 por cento.

Por outro lado, as ru­bricas Se­gu­rança e Ci­da­dania e Eu­ropa Global têm au­mentos subs­tan­tivos, mo­ti­vados por um lado com a res­posta às pres­sões mi­gra­tó­rias – com par­ti­cular en­foque na vi­gi­lância de fron­teiras, menos na so­li­da­ri­e­dade para com as ví­timas – e o re­forço dos ins­tru­mentos de po­lí­tica ex­terna da UE, que con­cre­tizam, no es­sen­cial, o cariz mi­li­ta­rista e opressor deste pro­jecto de in­te­gração eu­ropeu.

A ex­tensão deste do­cu­mento me­re­cerá um olhar mais in­ci­sivo sobre as pro­postas da co­missão, mas so­bre­tudo, sobre as pro­postas que os de­pu­tados do PCP no PE têm de­fen­dido. Vol­ta­remos a este as­sunto.

____________

(1) http://​eur-lex.eu­ropa.eu/​budget/​www/​index-pt.htm




Mais artigos de: Europa

Conflito iminente

Após uma se­mana em que as co­ta­ções da carne de suíno es­ti­veram sus­pensas, os pro­du­tores fran­ceses es­peram que a in­ter­venção do go­verno ponha fim à crise no sector.

As decisões do Eurogrupo sobre<br>a Grécia

Pronunciando-se sobre o novo pacote de auxílio financeiro à Grécia, anunciado, dia 14, pelos ministros das Finanças da zona euro, o PCP emitiu, dia 15, através do seu Gabinete de Imprensa, a seguinte nota: «O anúncio pelo Eurogrupo de um novo memorando para a...